terça-feira, 21 de julho de 2009

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“Acre, o fim do mundo” ou
“reféns da incompetência”



Gosto sempre de iniciar os meus textos quando já tenho um título definido. Isso me faz manter o foco no assunto que desejo tratar. O problema é que, muitas vezes, a parte mais difícil de um texto é definir o título. Este, por exemplo, é um deles. Na hora que pensei escrevê-lo me veio a dúvida: devo grafar “Acre, o fim do mundo”, ou seria melhor “Reféns da incompetência”?

Agora que ele já tem um início e toda uma estrutura montada em minha mente, estou me inclinando a achar que melhor seria a segunda opção.

O fato é que, nós últimos dias nós, acreanos, com “e”, nos vimos reféns de um mundo moderno e de más gerências nos serviços públicos oficiais, o que nos leva a uma situação similar à dos pioneiros, aqueles que, nos fins do século de 1800 e início do de 1900 iniciaram a colonização do Estado.

Naquele tempo era inevitável evitar longos meses nos vapores numa simples viagem que hoje se faz em menos de duas horas para Manaus, ou esperar outros meses por uma carta ou encomenda feita na metrópole. Se adoecia, era natural não ter assistência médica, pois aqui não tinha doutores. O que salvava eram as bebeiragens dos índios. Ou era isso ou enfrentar a subida de rio dias e dias dentro de um gaiola até encontrar o socorro em Manaus ou, nos casos mais graves, em Belém. De mais moderno, só os lampiões dos Barracões; na dos seringueiros iluminação mesmo só a das lamparinas a querosene.

Um novo século surge. A modernidade o acompanha. O terceiro milênio devia ser aquele em que nos beneficiaríamos da tecnologia, das novas fontes de energia e mesmo da maravilha que a informática propicia. Mas para o Acre não. Será por quê? Será porque isto aqui é realmente o fim do mundo? Ou será que somos realmente reféns da incompetência, da falta de vontade política ou da irresponsabilidade para com o social?

Ocorre que, se não dependemos mais do vapor, do regime de chuvas, do querosene para as lamparinas ou dos chás milagrosos dos pajés. Dependemos do linhão, do cabo de fibra ótica ou de um horário decente para embarcarmos numa viagem simples de duas horas.

Duas empresas operam o transporte aéreo para o Acre. Ambas dispunham apenas de voos noturnos. Apenas recentemente uma delas resolveu, a muito custo, mudar seus horários e realizar voos durante o dia. Antes, só de madrugada. Foi preciso a intervenção parlamentar para isso acontecer, pois elas, as empresas, não têm tanto interesse em atuar por essas bandas. Incompetência, garanto. São incompetentes para cumprir a função social a que se destinam e incompetentes para garantir o atendimento de um mercado consumidor pequeno, mas que detém os mesmos direitos dos do sul maravilha.

Há dias o Acre está sendo ameaçado de voltar ao tempo das lamparinas. Uma empresa pública, responsável pelo fornecimento de um dos mais importantes serviços do mundo moderno, o de geração e distribuição de energia, se mostra incompetente para tal. A Eletronorte não consegue evitar que o Acre passe por constantes apagões, prejudicando a população, afugentando investimentos econômicos e suprimindo direitos básicos da população.

Acuado pelo Ministério Público Federal (MPF), na segunda-feira, o diretor-presidente da Eletronorte, Jorge Palmeira, negou que a empresa seja responsável pelos constantes apagões. Segundo ele a energia chega sempre ao Acre sem nenhum problema e que a responsável seria a Eletroacre, que faz a distribuição no Estado.

Sabe, pra falar a verdade, não sei se Jorge Palmeira é desinformado ou se os funcionários da empresa que administra informam mal. Como repórter, já fiz, diversas vezes, matérias sobre os blackouts constantes desde que o linhão foi instalado. As informações colhidas diretamente na Eletronorte em Rio Branco é de que a culpa teria sido de pane no próprio linhão ou na geração em Porto Velho. Seria Palmeira um desses incompetentes?

E agora, mais especificamente de umas duas semanas para cá, estamos quase voltando ao tempo em que a comunicação com outras praças somente por carta.

A Brasil Telecom, que não é mais Brasil Telecom é Oi, se mostra incompetente para garantir a fluência de dados e voz nos cabos de fibra ótica que ligam este fim de mundo com o restante do país informatizado.

Os apagões tecnológicos provocados pela Oi deixam o Acre praticamente movido à querosene. Não funciona a internet, a telefonia fica deficiente, os serviços bancários ficam prejudicados e os setores de comércio e serviços têm prejuízos.

Citei três exemplos de situações nas quais incompetentes desrespeitam o Acre e sua gente, e de empresas que não cumprem seus papéis sociais e estão preocupadas apenas com o lucro ou com questões políticas de interesse pessoal ou de grupos. Mas há outros casos, esses mais frequentes e que nos afrontam bem de forma direta.

O que faremos, então? Seremos também incompetentes para evitar que nos afrontem? Ficaremos quietos e voltaremos mansamente à luz da lamparina? Aceitaremos que nos tratem como “gente do fim do mundo”?

Não sei vocês, mas eu vou ao menos gritar.

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